Muitas respostas se poderiam propor, todas fundamentadas e todas diferentes, nenhuma delas, porém, suficiente. Há dons comuns à maioria dos que sentem a necessidade de se esclarecer e comunicar pela arte, para quem a arte, digamos, é a sua voz, e há a peculiaridades que explicam cada caso individual. Escrever foi para mim, e desde o início, um modo de estar activamente presente no mundo e de participar de coisas que, sem esse veículo de interferência, me seriam vedadas ou, pelo menos, a cujo convívio não saberia dar expressão. Escrever foi e tem sido alvoroço, tortura e exaltação. Escrevo com prazer? Ainda hoje não saberei dizê-lo, pois nessa intensa e sofrida inquietude que o escrever me exige, no conflito árduo entre o que pretendo e o que realizo, na insatisfação sempre crescente, na angústia e no desânimo, há, decerto, um deleite para o qual não se encontrou ainda a palavra ajustada. Se, enfim, escrever me atormenta, são mais difíceis de suportar as fases estéreis de corrosiva aridez.
domingo, 9 de outubro de 2011
7.
- Porque se tornou escritor? Dá-lhe prazer escrever?
Muitas respostas se poderiam propor, todas fundamentadas e todas diferentes, nenhuma delas, porém, suficiente. Há dons comuns à maioria dos que sentem a necessidade de se esclarecer e comunicar pela arte, para quem a arte, digamos, é a sua voz, e há a peculiaridades que explicam cada caso individual. Escrever foi para mim, e desde o início, um modo de estar activamente presente no mundo e de participar de coisas que, sem esse veículo de interferência, me seriam vedadas ou, pelo menos, a cujo convívio não saberia dar expressão. Escrever foi e tem sido alvoroço, tortura e exaltação. Escrevo com prazer? Ainda hoje não saberei dizê-lo, pois nessa intensa e sofrida inquietude que o escrever me exige, no conflito árduo entre o que pretendo e o que realizo, na insatisfação sempre crescente, na angústia e no desânimo, há, decerto, um deleite para o qual não se encontrou ainda a palavra ajustada. Se, enfim, escrever me atormenta, são mais difíceis de suportar as fases estéreis de corrosiva aridez.
Fernando Namora, in Encontros (Lisboa, 1979-81)
Muitas respostas se poderiam propor, todas fundamentadas e todas diferentes, nenhuma delas, porém, suficiente. Há dons comuns à maioria dos que sentem a necessidade de se esclarecer e comunicar pela arte, para quem a arte, digamos, é a sua voz, e há a peculiaridades que explicam cada caso individual. Escrever foi para mim, e desde o início, um modo de estar activamente presente no mundo e de participar de coisas que, sem esse veículo de interferência, me seriam vedadas ou, pelo menos, a cujo convívio não saberia dar expressão. Escrever foi e tem sido alvoroço, tortura e exaltação. Escrevo com prazer? Ainda hoje não saberei dizê-lo, pois nessa intensa e sofrida inquietude que o escrever me exige, no conflito árduo entre o que pretendo e o que realizo, na insatisfação sempre crescente, na angústia e no desânimo, há, decerto, um deleite para o qual não se encontrou ainda a palavra ajustada. Se, enfim, escrever me atormenta, são mais difíceis de suportar as fases estéreis de corrosiva aridez.
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